Masterclasses 2018

Mentes Digitais: Ficção Científica ou Futuro Próximo?

Arlindo Oliveira
Presidente do Instituto Superior Técnico e Professor do Departamento de Engenharia Informática

Resumo: O que têm em comum os computadores, as células e os cérebros? Os computadores são dispositivos electrónicos concebidos por humanos, as células são entidades biológicas criadas pela evolução e os cérebros são os recipientes e os criadores das nossas mentes. Mas todos eles são, de uma forma ou de outra, máquinas que processam informação. O poder do cérebro humano é, por enquanto, incomparavelmente superior ao de qualquer máquina ou ser vivo conhecidos. Porém, após milhões de anos de evolução, o cérebro humano permitiu-nos desenvolver ferramentas e tecnologias que facilitam as nossas vidas e mesmo criar computadores quase tão poderosos como o próprio cérebro. Neste seminário, descreve-se como os avanços na ciência e tecnologia poderão vir a permitir a criação de mentes digitais e tenta responder-se a uma questão inevitável: é o cérebro humano o único sistema capaz de acolher uma mente, inteligente e consciente?  Se as mentes digitais, artificiais ou naturais, se tornarem uma realidade, quais serão as implicações sociais, económicas, legais e éticas? Serão as mentes digitais nossas parceiras ou nossas rivais?

Nota Biográfica: Arlindo Oliveira licenciou-se pelo Instituto Superior Técnico e doutorou-se pela Universidade da Califórnia em Berkeley, em Engenharia Eletrotécnica e de Computadores. É presidente do Instituto Superior Técnico e professor do Departamento de Engenharia Informática, onde lecciona, entre outras, cadeiras nas áreas de Algoritmos, Biologia Computacional e Neuroengenharia. Tem desenvolvido trabalho de investigação em sistemas digitais, síntese lógica, algoritmia, aprendizagem automática e bioinformática. É autor do livro The Digital Mind, editado pela MIT Press e recentemente lançado em Portugal sob o título «Mentes Digitais».

A Astronomia dos Lusiadas

Carlos P. Santos & Carlota Simões

A “Astronomia dos Lusíadas” consiste numa série de artigos publicados na Revista da Universidade de Coimbra, entre 1913 e 1915, por Luciano Pereira da Silva (1864-1926), matemático e lente catedrático em Coimbra. Neste seu trabalho, Luciano Pereira da Silva deixou completamente esclarecidas todas as referências à astronomia de Os Lusíadas, mostrando que Camões tinha um conhecimento claro e seguro dos princípios da astronomia, como ela se professava no seu tempo”. Parece claro que as ideias astronómicas de Luís de Camões (1524-1579) são as do texto de João Sacrobosco (1195-1256), com as modificações contidas nas notas do grande matemático português Pedro Nunes (1502-1578). Ou seja, o Tratado da Sphera de Pedro Nunes pode ser considerado a principal fonte astronómica de Os Lusíadas.

O poema relata a primeira viagem por mar da Europa à Índia, entre Julho de 1497 e Maio de 1498, comandada por Vasco da Gama (1469-1524). Camões só iria nascer duas décadas mais tarde, mas acabaria por fazer a mesma viagem para a Índia entre 1553 e 1554, partindo na frota de Fernão Álvares Cabral (1514-1571), o filho mais velho de Pedro Álvares Cabral. A frota enfrentou dificuldades no Cabo das Tormentas e a nau São Bento, aquela em que iam Camões e Fernão Álvares Cabral, escapou por pouco. A sua obra foi publicada em 1572, três anos após o seu regresso do Oriente. Camões diz de si próprio

«Nem me falta na vida honesto estudo,
com longa experiência misturado,
nem engenho, que aqui vereis presente,
cousas que juntas se acham raramente».
(Os Lusíadas, X, 154)

Importa sublinhar que a vasta cultura de Camões não é apenas fruto da sua experiência. O poeta tinha um enorme respeito pelo estudo e pela ciência. De novo pelas suas próprias palavras,

«Os casos vi, que os rudos marinheiros,
Que têm por mestra a longa experiência,
Contam por certos sempre e verdadeiros,
Julgando as cousas só pola aparência,
E que os que têm juízos mais inteiros,
Que só por puro engenho e por ciência
Vêm do mundo os segredos escondidos,
Julgam por falsos ou mal entendidos.»
(Os Lusíadas, V, 17)

Os Lusíadas é uma obra de enorme amplitude. Além de uma estética literária inigualável, contém uma enorme riqueza relativa a vários aspectos, tais como geografia, história, cultura pagã, ciência, astronomia, etc. Nesse sentido, a interdisciplinaridade é uma constante, tendo sabido o poeta interligar essas temáticas de forma consistente e musical, com um conhecimento de causa a todos os títulos desarmante. Esta variedade de temáticas serve a composição de forma contextualizada, nunca aparecendo de forma forçada, mas sim ao serviço da exaltação das várias ideias e episódios.

Estando bem enquadrada com episódios da cultura pagã, suportada em eventos reais ocorridos nos céus da primeira viagem de Gama, associada a localizações no espaço e no tempo, a astronomia, antes de qualquer outra coisa, surge ao serviço da musicalidade e da estética poética.

É claro que a análise da utilização camoniana da astronomia tem muita importância científica e histórica. Por exemplo, Luciano Pereira da Silva demonstrou terem sido os portugueses os primeiros a identificarem a nova constelação Cruzeiro do Sul, em contraste com a opinião de Humboldt (1769-1859) que indica uma carta datada de 1515 e escrita pelo florentino Andrea Corsali como a mais antiga referência de sempre à constelação do Cruzeiro.

Não esquecendo a vertente mais técnica, o objectivo desta conferência consiste em divulgar o trabalho de Luciano de uma forma alternativa. Em vez de organizar a discussão por temas astronómicos como a Lua, Sol, sistema ptolemaico, etc., o fio condutor será a própria viagem espaço-tempo do poema. Dessa forma, uma preocupação central será abordar os vários tópicos astronómicos ao mesmo tempo que se percorre a odisseia lusitana cantada por Camões. Serão apresentadas algumas interpretações astronómicas originais. Também serão apresentados alguns fenómenos ocorridos nos céus de 1497/1498 que também poderiam ter sido utilizados pelo poeta, tivesse ele sabido deles.

Serão utilizados alguns diagramas geométricos feitos no programa Geogebra. Em particular, foi concebida uma plataforma que permite efectuar a viagem sobre uma projecção de Mercator (mexendo com o rato numa pequena caravela portuguesa) ao mesmo tempo que se acompanha uma visualização tridimensional e um mapa estelar dos céus de 1497/98. Todos os vídeos dos céus foram feitos com auxílio do programa Stellarium.

Também se pretende proporcionar, tanto quanto possível, uma experiência sonora. Segundo António José Saraiva (1917-1993),

Um velho preconceito tornou Os Lusíadas apanágio dos eruditos e das escolas; mas há no Poema uma oralidade viva, um sabor da palavra gostosa que é própria dos bardos, aedos, dos jograis, dos Antónios Aleixos que nos restam. É um livro para ser entoado por recitadores, e não analisado por gramáticos. Por vezes interessa pouco o que ele diz, e vale só a língua sonora que percorre os vários graus da escala, uma palavra que esplende, um som rouco de queixa ou um gesto teatral que se entrevê. Por vezes, também, é um brinco meio irónico com palavras que se repetem ou opõem, como os poetas sempre gostaram de fazer diante dos seus auditores…

Inspirado nestas ideias, o actor português António Fonseca (1953‑) decorou a obra para a poder declamar. São dele os áudios que serão apresentados. Muitos agradecimentos por esta disponibilização.

Este é um trabalho conjunto de Carlos Pereira dos Santos (CST e CEAFEL-Universidade de Lisboa) e Carlota Simões (CFisUC e Museu da Ciência – Universidade de Coimbra). Com o tempo, dada a extensão do conteúdo envolvido, um trabalho mais ou menos fechado foi-se transformando num projecto em curso. Por esse motivo, outras abordagens poderão ser usadas na conferência, sem que estejam referidas neste resumo alargado.

Universidade, mas que sítio é este?

Henrique Leitão

A Universidade é a instituição e o local onde passaremos vários anos da nossa vida. Mas exactamente de que instituição se trata? Que se espera de nós? E que podemos esperar da Universidade? Fomos para a Universidade exactamente para quê? E o que é isso de “experiência universitária”? Mas que sítio afinal é a Universidade?